O nascimento de Sorriso pelo olhar de Catarina

Catarina Raiser Francio é a mulher que viveu um momento histórico no início do povoado, em uma vila aberta no mato ainda sem nome. Registros fotográficos dela, de lenço na cabeça, cozinhando em um fogão cuja base era feita sobre ninhos de cupim são referência no Centro Histórico Cultural Benjamim Raiser.
Catarina Raiser é uma das filhas de Benjamin Raiser, o homem que deu início ao processo de colonização de Sorriso adquirindo terras no Mato Grosso – ele e a esposa, Catarina Daneda, já haviam desbravado parte dos três estados do Sul do país. Catarina, que carrega o nome em homenagem à mãe e à sogra da mãe, nasceu em 21 de janeiro de 1942 na comunidade de Rio das Antas, à época pertencente à Caçador (SC). Criada na roça, entre a lida na lavoura e a serraria que o pai era proprietário, a menina Catarina teve uma infância feliz.
“Era todo mundo igual, a gente trabalhava, ajudava em casa meio período e no outro meio período íamos para a escola”, relata. A escola que ofertava somente as séries primárias ficava nas terras do pai; atendia crianças da redondeza, filhos dos demais colonos e dos colaboradores da serraria de Benjamin que tinha cerca de 30 funcionários.
É da escola primária a primeira lembrança de Catarina sobre o Mato Grosso. “Eu era pequena, devia ter uns 10 anos de idade e falava para todo mundo que iria morar no Mato Grosso”, diz. A frase reproduzia o que a menina ouvia em casa: o pai comentava, estimulado pela política de expansão nacional, com a mãe e com os vizinhos que iria comprar terras no Centro-Oeste. E na cabeça da menina soavam as informações sobre um lugar que não tinha frio e nem geada – a gélida formação da camada de cristais de gelo sobre plantas ou sobre outras superfícies, que congelava os pés de Catarina e das outras crianças no inverno no caminho da escola. O tempo passou, o pai foi atrás das terras, mas como demorou muito para tomar posse acabou perdendo-as. E, momentaneamente o “ir embora para o Mato Grosso” ficou como um sonho na gaveta.
É nesse ambiente que Catarina cresce. Trabalhando na lavoura, colhendo milho, feijão, ou ajudando na cozinha na produção de paneladas de comida que serviam para alimentar a família grande, eram 11 filhos, colaboradores e vizinhos nos dias de “troca de serviço para adiantar o trabalho na roça”. De tudo um pouco os filhos de Benjamin aprendiam. “Eu queria era estudar, mas meus irmãos mais velhos foram pro internato e não ficaram. Quando chegou a minha vez o pai não deixou mais ir”, lembra. Assim, ela aprendeu a cuidar da casa, dos irmãos, cuidar dos animais domésticos, bordar, costurar. “De tudo um pouco, aprendíamos os afazeres domésticos, da roça e da serraria também, como era costume de todas as famílias da época”.
Com 18 anos, Catarina conhece Nelson Francio. O rapaz nascido em 23 de janeiro de 1938 era de Videira, município vizinho. Comemoravam aniversário com apenas dois dias de diferença. Outra coincidência unia os dois: a mãe de Nelson também se chamava Catarina. Filho de Catarina Bressiani e Francisco Francio, Nelson havia crescido em um ambiente similar ao da amada: lidava com agricultura e também fora criado em uma propriedade rural. Seis anos depois do início do namoro, Catarina e Nelson se casam. O ano era 1965, e a vida segue o ritmo normal. O casal escolhe Rio das Antas (SC), agora já emancipada desde 1958, para fixar residência e trabalhar na serraria. É lá que nascem Gerson Luiz, Janes Aparecida e Lenoir Marcos, o Leno. O ritmo é marcado pelas estações do ano, o cultivo de milho e trigo e o cuidado com os animais.
“Era uma vida boa, calma, tínhamos uma casa muito boa; morávamos perto dos meus pais, dos meus sogros, meus irmãos, cunhados, éramos uma família muito grande. Tanto eu quanto o Nelson tínhamos 11 irmãos cada um”, lembra. Com uma família realmente grande por perto, sempre havia a quem recorrer. Além da lavoura, a família do Nelson tinha uma malharia em Videira. Mesmo assim, o jovem casal começou a conversar sobre deixar Rio das Antas e buscar um novo lugar para viver e crescer. O pai de Catarina já havia adquirido terras no Paraná e enviado um dos filhos para o estado vizinho.