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TURISMO: UMA TERRA QUE NÃO FOI DESCOBERTA

Publicado em 11 de Junho de 2019 ás 15:19

Para além das lavouras de soja e algodão que fazem a fama econômica de Sapezal existe uma riqueza que não foi descoberta. São milhares de quilômetros de floresta nativa, na transição entre o Cerrado e a Amazônia, cortados de rios cristalinos, com cachoeiras esculpidas pela natureza. Esse santuário natural guarda ainda 8 aldeias indígenas, de duas grandes nações e mais de 10 diferentes etnias. É uma terra que não foi descoberta pelas máquinas do agronegócio, mas que está pronta para ser pelo turismo

Agronegócio: o vilão da natureza e genocida dos índios. Esse é um dos rótulos atribuídos a principal atividade econômica de Mato Grosso – talvez o mais duro deles. O setor é considerado por muitos um carrasco do meio ambiente e dos povos indígenas, principalmente no Estado, que em 4 décadas se tornou uma das maiores fronteiras agrícolas do país. A fama decorre da condição irreversível de que, para plantar é preciso antes remover toda a cobertura que existia no solo – e com ela toda a biodiversidade de fauna e flora. Em suma, é preciso “descobrir” a terra. Quando isso acontece, não sobra nada para ver além de soja e pasto, certo?

Errado! Sapezal, no oeste de Mato Grosso, é uma das principais fronteiras agrícolas do país, incrustada na transição entre o Cerrado e a Amazônia Legal, com uma produção que só não é mais invejável que as riquezas naturais e indígenas presentes em seu território. O município conseguiu conciliar ao longo dos seus 25 anos o avanço econômico da agropecuária com a preservação do meio ambiente e a proteção dos povos indígenas nativos. O que Sapezal fez não serve apenas como um raro exemplo para desmentir o rótulo do agronegócio e fazer “bonito” para o resto do mundo. A terra que não foi “descoberta” pelo agro, agora começa a ser descoberta pelo turismo.

Viajar para Sapezal pela primeira vez gera uma quebra de paradigma. Quando se percorre as regiões produtivas de Mato Grosso, antes de cada cidade há quilômetros de lavouras. É o que o viajante espera na primeira ida a Sapezal – berço dos grandes grupos do agronegócio no Estado. Mas não é o que acontece.

Logo na saída de Campo Novo dos Parecis, na MT-235 que leva até Sapezal, uma placa orienta o viajante: Rodovia João Arrezoamae (João Garimpeiro). A estrada aberta pelo pioneiro e fundador do Grupo Amaggi, André Maggi, anos depois pavimentada pelo Governo do Estado, foi batizada com o nome de um cacique indígena.

Não se trata apenas de uma homenagem. Essa estrada pertence aos índios – pelo menos parte dela. Para continuar na rodovia é preciso pagar pedágio para uma associação indígena formada pelos povos Halitinã e Waimaré. Isso porque a MT-235 corta o território indígena dessas nações.

O viajante percorre 52 km de rodovia em meio a uma reserva indígena plenamente preservada. Esse é o portão de entrada de Sapezal, uma primeira impressão que se conserva ao longo do seu território.

O município possui 13,5 mil quilômetros quadrados de extensão. Desse total, 7,5 mil quilômetros quadrados são áreas “abertas”, destinadas a agropecuária – o que corresponde a 55% do território. Nesse percentual também estão áreas de agricultura dos povos indígenas (listadas nessa edição na reportagem “Caciques do Agronegócio”).

Ao lado da riqueza óbvia de Sapezal, estão 4.934 quilômetros quadrados de áreas indígenas. Cerca de 36% do território do município pertence aos povos indígenas.

Sobram relatos, tanto de produtores como de líderes indígenas que falam do ambiente de harmonia entre as duas sociedades ao longo da formação de Sapezal. Ronaldo Zokezomaiake, líder dos Paresis, atribui aos primeiros agriculturas a demarcação das terras indígenas que só anos depois se tornariam reservas reconhecidas pelo Governo Federal.

Ao decidir respeitar os espaços dos povos indígenas, os desbravadores de Sapezal conseguiram estalar o progresso que a agricultura gera em curto prazo, ao mesmo tempo em que preservavam uma riqueza a ser explorada no futuro: o turismo.

Sapezal só começou a se dar conta do tamanho do seu potencial turístico em 2003. Foi quando o município recebeu o Selo de Prata da EMBRATUR (Empresa Brasileira de Turismo). Esse selo relaciona os municípios que estão aptos a realizar o Plano de Definição de Estratégias de Desenvolvimento Turístico – que são as primeiras políticas públicas para desenvolver a atividade. Receber o Selo de Prata, significa que a cidade tem potencial para desenvolver o turismo e, portanto, pode ter acesso aos recursos do FCO (Fundo Constitucional do Centro-Oeste) e do FUNGETUR (Fundo Geral do Turismo) para financiar projetos.

A classificação da EMBRATUR foi um estímulo, mas nem tanto. Sapezal levou 10 anos para concluir seu inventário turístico e estabelecer em lei o seu Fundo Municipal e o Conselho Gestor do Turismo – ambos criados em 2013.

De forma geral, Sapezal ainda engatinha quando o assunto é investimento em turismo. Tanto o setor público e quanto a iniciativa privada, exploram uma pequena fagulha do potencial turístico do município. Nesse setor há um campo tão fértil quanto o agronegócio, esperando para ser descoberto.

DE ANTES DO DESCOBRIMENTO

O turismo étnico, por si só, é interessante. Em Sapezal, há um “bônus”. Existem aldeias que foram estabelecidas nos lugares mais paradisíacos do Estado de Mato Grosso

Nativos brasileiros, povos que estão nesse país antes dele ser um. Multidiversa, cada nação indígena viva guarda um pedaço da história do Brasil antes da ocupação européia e das grandes migrações. Por isso, cada vez mais pessoas, de vários lugares do mundo, buscam conhecer a cultura dos nativos sulamericanos antes da influência européia. É o chamado “Etnoturismo”, ou simplesmente, Turismo em terras indígenas.

Esse é um dos potenciais de Sapezal. Nos quase 5 mil quilômetros quadrados de terra indígena existentes no município existem 8 aldeias, com diferentes níveis de influência da cultura ocidental.

Os indígenas que vivem em Sapezal pertencem a dois grandes grupos: os Nambikwara e os Paresis-Haliti.

A nação Nambikwara agrupa descendentes das etnias Irantxe, Terena, Rikbatse e também Paresis. Os Nambikwara são possivelmente um dos mais fascinantes povos indígenas do mundo. Sua origem remonta ao século 12. O primeiro contacto que os Nambikwara tiveram com pessoas não indígenas, foi por volta de 1907, durante a construção das linhas telegráficas em uma missão liderada pelo Marechal Cândido Rondon.

No passado, os Nambikwaras ocupavam uma extensa região em função da sua mobilidade espacial. Ao longo dos anos, antropólogos conhecidos, como Claude Lévi-Strauss (nos anos 30) e David Price (na década de 70), buscaram estudar esse povo indígena.

Ambos se referem aos Nambikwara como sendo dotados de uma cultura material aparentemente simples e de uma cosmologia e um universo cultural extremamente complexos. São povos indígenas que preservam sua identidade através de um misto de altivez e abertura ao mundo. David Price, se referindo a presença de missionários católicos entre os Nambikwaras escreveu: “apesar da pesada evangelização, nunca conheci um Nambikwara cristão”.

A base da alimentação desse povo é a mandioca (beiju), frutas do cerrado, caça e pesca, além de produtos industrializados. Os Nambikwara cultivam arroz, feijão, milho, frutas e hortaliças.

Uma das tradições ainda conservadas é a Festa da Menina Moça. Trata-se de um ritual da puberdade feminina que pode durar 3 meses. Nesse tempo, as jovens da tribo ficam isoladas em uma “maloca” feita de folhas de buriti, até que ocorra a primeira menstruação. No final, uma festa em comemoração é realizada.

Os Nambikwara também realizam a Festa do Espírito e da Flauta Sagrada, comemorações de natureza xamânica.

A segunda grande nação presente em Sapezal são os Paresi, que se autodenomina “Haliti” – que em português quer dizer “gente” ou “povo”. Esse “povo” é formado pelas etnias Kaxiniti, Waimaré, Kawáli, Warére, Kozareni e os Enomanyerekahete.

Os Paresi são agricultores e artesões de bolas coloridas de magaba, de bem acabados cestos e espanadores de pena de ema. Os Haliti usam histórias e mitos para explicar as diferenças no interior do grupo e o sentimento de pertencimento que os une. A grande maioria são bilíngües, falando fluentemente no seu cotidiano a língua materna.

Seus hábitos alimentares e seus cultivares são os mesmos dos Nambikwara. Os Paresi têm duas organizações associativas políticas: Halitinã e Waimaré que através delas administram o pedágio na MT-235.

Os Paresi acreditam que as florestas e os rios são habitados por espíritos. Uma serpente espírito e sua esposa eram cultuados na casa dos homens, onde a serpente era representada por uma espécie de trombeta e sua esposa, por uma flauta. Algumas doenças ainda são tratadas pelos poucos xamãs existentes, que têm a reputação de serem capazes de voar.

O mito de origem dos Halíti conta que no começo só existia Enoré, que tinha uma filha e um filho. Quando seus filhos foram buscar água para ele, escutaram um barulho e a terra estremeceu. Eram os Paresí emergindo de dentro da abertura de uma rocha nas proximidades de uma ponte natural de pedra, localizada sobre um dos afluentes do Rio do Sangue. Um pequeno pássaro voou para fora da pedra por uma fenda, retornando mais tarde para dizer aos outros como era bonito lá fora. Então Wazáre, o herói mítico, persuadiu vários pássaros e animais para que aumentassem a fenda para que todos pudessem sair. Quando saíram, os irmãos tinham uma aparência singular: eram peludos, possuíam rabos, tinham dentes compridos e membranas entre os dedos das mãos e dos pés sugerindo que estivessem em um estado “quase humano”. O mito segue, com uma riqueza de detalhes, narrando a transformação gradual desses antepassados, com a ajuda dos animais, até dar origem ao povo Haliti.

Hoje é possível visitar tanto as aldeias Nambiwaras quanto Paresi em Sapezal e presenciar de perto os traços culturais. Os passeios precisam ser organizados por um guia turístico que possui a permissão de cada cacique para visitar a tribo. Há programas de um dia até 5 dias. Os turistas podem acampar nos locais, inclusive dormir em casas tradicionais dos indígenas da etnia Pareci – a chamada “hati”.

Os passeios guiados costumam apresentar histórias míticas, rituais de dança, canções tradicionais e pinturas corporais indígenas aos visitantes. A interação com os índios é um dos pontos altos desse tipo de turismo, seja com a simples observação dos costumes ou com a imersão. Algumas aldeias chegam a vender trajes típicos da etnia para os turistas usarem.  O turismo étnico, por si só, é interessante. Em Sapezal, há um “bônus”. Existem aldeias que foram estabelecidas nos lugares mais paradisíacos do Estado de Mato Grosso.

O ENCANTO DAS ÁGUAS

Sapezal tem em seu território 7 rios: o Verde, Sacre, Bacoval, Buriti, Sapezal, Papagaio e o gigante Juruena. Todos com nascentes preservadas. A maioria nasce dentro de terras indígenas e ao longo de toda sua extensão apresentam águas cristalinas, de transparência profunda. O relevo com acidentes geográficos que mais parecem terem sido feitos “de propósito”, cria cenários de beleza natural impar.

O mais singular de todos pontos turísticos de Sapezal talvez seja o Salto do Utiariti. Localizado há pouco mais de 90 km do centro da cidade, na divisa com o município de Campo Novo, o Salto do Utiariti é uma queda de água com aproximadamente 90 metros de altura, no cristalino Rio Papagaio. A cachoeira forma um cânion que visto de cima lembra o mapa do Brasil. Em 2017, em um concurso realizado pelo Secretaria Estadual de Turismo, o Salto do Utiariti foi considerado a mais bela cachoeira de Mato Grosso (lembrando que o Estado tem um complexo de cachoeiras em Chapada dos Guimarães que figuram entre os principais destinos turísticos do Brasil).

Além da água cristalina, da sua dimensão tanto vertical como horizontal e do formato inspirador, o Salto fica em uma área de transição de biomas entre o cerrado e a floresta Amazônica. Como são terras indígenas, a preservação permite a observação de diversas espécies de plantas e animais dos dois ecossistemas.

O local é especialmente procurado por praticantes de escalada e rapel. A descida com cabo, em queda livre, por entre as águas da cachoeira é descrita pelos rapelistas como uma experiência única. 

O acesso ao Salto do Utiariti é através de uma aldeia indígena que fica a 300 metros da cabeceira da cachoeira. É possível chega até lá de caro. Na parte de cima há ótimos lugares para banho. Por uma trilha (grau de dificuldade médio), é possível chegar até a parte de baixo da queda. Nesse local existe uma caverna com um pequeno lago dentro.

No Salto do Utiariti é possível combinar turismo ecológico, de aventura, étnico e também histórico. Isso porque, nesse local passou a linha de telégrafo instalada pelo Marechal Rondon, em 1907. Postes por onde passavam o cabeamento e as ruínas da casa que Rondon utilizava para dormir ainda podem ser vistas.

Também foi nesse local que se instalou a Missão Jesuíta Utiariti, em 1930. A missão que perdurou por mais de 40 anos foi responsável pela construção da primeira escola indígena de Mato Grosso. Suas ruínas podem ser visitadas, bem como a igreja da época.

A aldeia conta com uma única oca, o “hali”, aberto para visitação. O local tem luz e água, ambos alimentados por energia solar.

O nome do salto significa “lugar de gente sabida”, em Aruák, a língua dos Paresi. A lenda conta que os índios da etnia Uthya, que viviam ali, eram capazes de fazer previsões do futuro, como clima e acontecimentos envolvendo a tribo. Até hoje o Utiariti é um local de cultos e celebrações para diferentes etnias.

Outro roteiro que combina turismo ecológico com étnico é o Salto da Mulher. Trata-se de uma cachoeira com 8 metros de altura no Rio Sacre. O ponto de acesso é uma aldeia indígena do povo Paresi, onde é possível chegar de carro. Danças, artesanatos e demonstrações de tiro com arco e flecha podem ser acompanhados pelos turistas.

Para chegar à cachoeira é preciso percorrer uma trilha de 600 metros. A água cristalina, muito límpida, com uma tonalidade verde esmeralda encanta os visitantes. Há vários pontos para banho, mergulho e flutuação.

O Salto da Mulher leva esse nome porque a tradição Paresi conta que duas meninas desapareçam na queda enquanto se banhavam. Os nativos acreditam que elas estão presentes no local até hoje.

Seguindo o roteiro de belezas naturais de Sapezal, há 120 km do centro pela BR-364, tem a Ilha do Papagaio. Essa ínsula fluvial se forma no encontro dos Rios Papagaio e Buriti. O local é aberto para camping, com infra-estrutura como lanchonete, restaurante cabana e banheiro. Além da água límpida, a Ilha do Papagaio oferece opções de esportes radicais, como tirolesa, canoagem e rafting. Também é permitido pescar no local.

Se a proposta for ser radical, a dica é pegar a estrada até o Cachoeirão do Juruena – o maior rio que passa por Sapezal. Uma queda de água violenta, com 35 metros de altura e uma vazão de 200 mil litros por segundo revela toda potência da natureza. O local inspira uma beleza cênica, com um rio largo que se divide ao meio em uma pedra formando duas quedas. Um cenário digno dos novos games de aventura – e foi.

Em 2016, o atleta de aventura Pedro Oliva decidiu que saltaria os 25 metros do Cachoeirão do Juruena em um caiaque. Desde 2011 ele pensava no assunto. Faltava um estímulo. Cinco anos depois, a franquia de jogos para Playstation 4 se preparava para soltar o Uncharted 4 – um dos games de maior sucesso no mundo. Para promover o lançamento do jogo, a empresa anunciou o desafio “Conquer the Uncharted” (Conquistar o desconhecido, em português). Basicamente, a ideia era desafiar alguém na vida real a fazer algo no nível de risco que o personagem central do game. Oliva topou e desceu o Cachoeirão do Juruena de caiaque. A franquia do Uncharted acompanhou pessoalmente as gravações. O vídeo percorreu o mundo como material promocional do game que viraria febre.

Repetir o feito de Pedro Oliva não é recomendado. Mas qualquer turista pode visitar o local e contemplar a cachoeira, percorrer trilhas ou aproveitar a água. O Cachoeirão ainda é carente de infraestrutura, mas uma boa opção para os turistas mais “raiz”.

Ainda no Rio Papagaio, mas na MT-235, há 40 km de Sapezal, o Balneário do Pubi é a forma logisticamente mais fácil de experimentar a riqueza dos recursos hídricos dessa região. A estrutura de pousada fica às margens da rodovia. O local começou a ser ocupado há quase 3 décadas pelo pioneiro Valdemar Zimmermann, mais conhecido como Pubi. Ele sempre teve um “amor” pelos 20 hectares de área que conquistou ao lado das cachoeiras do Rio Papagaio – preservando ao máximo. Hoje, após sua morte, seus filhos mantém a mesmo filosofia, administrando a pousada e interferindo o mínimo possível na natureza.

O Balneário oferece cabanas para hospedagem, além de quiosques com churrasqueira, um restaurante e piscina – que é dispensável. O acesso ao rio é fácil, por um gramado que acaba em uma prainha de areia. A água é límpida, com uma sequência de corredeiras mansas ideais para flutuação, mergulho e canoagem. Nos 15 hectares de mata preservada é possível fazer caminhadas e andar de bicicleta através das trilhas.

Como o acesso é fácil e a infraestrutura é praticamente urbana, o Balneário recebe cerca de 1,5 mil pessoas por final de semana.

Uma opção ainda mais urbana para aproveitar as belezas naturais de Sapezal é a Prainha Municipal. Esse parque público cuidado pela prefeitura fica dentro do perímetro urbano da cidade, em um dos braços do Rio Sapezal. É um dos legados deixados pelo fundador, André Maggi. O espaço preservado conta com amplo bosque, com vias pavimentadas, quiosques com churrasqueira, água encanada e energia elétrica. Qualquer pessoa pode utilizar a estrutura, de forma gratuita, seja para fazer uma caminhada ou exercícios na academia popular, para as crianças brincarem no parquinho ou para reunir o pessoal no final de semana para o churrasco.

O ponto alto da Prainha é a praia. O lago represado tem água cristalina, muitos peixes e uma areia branca. É nesse local que anualmente o Lions Clube organiza o tradicional Festival de Pesca. Também é possível fazer passeios de barco e mergulhos.

E por falar em mergulho...

O ‘‘CÉU’’ DOS MERGULHADORES

É quase impossível descrever os rios de Sapezal sem utilizar a expressão “água cristalina”. Mas o termo não foi utilizado nessa reportagem a toa. Os cursos hídricos desse município são límpidos como em poucos lugares do mundo. E essa é uma opinião de especialista.

Jorge Anturo Salgado é um chileno que se mudou para Sapezal há 20 anos. Ele veio por causa da água. Jorge é mergulhador profissional, com a graduação que o ramo chama de OWSI (Open Water Scuba Instructor) – basicamente a pessoa que está habilitado e tem experiência suficiente para treinar outros mergulhadores. Além de trabalhar na manutenção submersa das barragens de hidrelétricas que existem na região, Jorge abriu uma empresa voltada para o turismo, com foco no mergulho.

A “Mergulho Total” forma mergulhadores de primeira viagem e organiza roteiros para quem já tem experiência e viaja em busca de locais propícios para prática. Segundo Jorge, pessoas de todo mundo procuram a região para mergulhar. “Sapezal tem mais de mil ótimos pontos para mergulho, de 15 a 45 metros de profundidade. É uma região com abundante vida aquática, com peixes, algas e vegetação”, comenta.

Segundo Jorge, é muito raro não ter condições favoráveis ao mergulho nos rios de Sapezal. “A água é sempre limpa. A turbidez é favorável o ano inteiro. Como a maior parte desses rios passam por reservas indígenas, os rios são muito preservados e há muito para ser observado debaixo d'água”, explica o mergulhador.

A limpidez da água nos rios de Sapezal gera uma sensação ao mergulhador de que ele está voando. Com cilindros e máscara, a transparência da água, depois de certo tempo, blefa os sentidos, gerando a falsa impressão de estar flutuando fora da água. “Mergulhando se tem quase a mesma nitidez de estar olhando fora da água”, completa.

Jorge é um OSWI credenciado na PADI (Professional Association of Diving Instructors). Para quem não é do ramo, a PADI é a maior e mais reconhecida certificadora de mergulho do mundo, reconhecida em 186 países e responsável pela formação de mais de 23 milhões dos mergulhadores planeta afora. Quem quer mergulhar sempre dá preferência a um PADI.

A Mergulho Total tem uma estrutura para atender simultaneamente 8 pessoas. O Discovery (curso com primeiro mergulho), pode ser realizado inclusive na Prainha do Município e custa cerca de R$ 100,00. Segundo Jorge, sua empresa forma mais de 50 mergulhadores por ano. “De cada 10 pessoas que mergulham, 9 continuam mergulhando sempre”, revela Jorge.

APENAS NEGÓCIOS

Sapezal ainda tem uma quarta modalidade de turismo: o de negócios. Técnicos, engenheiros, especialistas e prestadores de serviço que se deslocam até o município para realizar trabalhos temporários compõem a massa do fluxo local. É esse tipo que mantém a rede hoteleira com alta lotação, movimenta bares e restaurantes da cidade, junto com uma rede de serviços que acaba atendendo quem está de passagem.

Essa modalidade de turismo de negócios é comum na maioria dos municípios com alta produção agrícola. A novidade que vem sendo observada é que, cada dia mais pessoas de outros países estão visitando Sapezal.

Compradores internacionais, vendedores, intermedia-dores, donos de indústrias no exterior e produtores rurais de vários países do mundo estão incluindo Sapezal em seus destinos de viagem. O que requer um certo esforço. Para chegar a Sapezal, o empresário de qualquer lugar do mundo precisa de, pelo menos, 2 voos e mais 460 km por rodovia. “Apesar das distâncias, muita gente tem vindo para Sapezal observar o que está acontecendo”, comenda o secretário de Desenvolvimento Econômico do município, Regis Martins.

Os grandes produtores de algodão costumam receber diretores de indústrias estrangeiras interessados em conhecer a origem da fibra e a capacidade dos cotonicultores de garantir a demanda. No setor, é comum firmar contratos para mais de 2 safras.

Há também os “curiosos”. Em janeiro de 2019 um grupo de 38 produtores rurais dos Estados Unidos e do Canadá viajaram, em bloco, para Sapezal. Eles passaram 3 dias no município com o único propósito de “conhecer” a produção agrícola da região.

Um dos locais visitados pela comitiva foi a Fazenda Santa Luzia, do Grupo Bom Futuro – um dos gigantes do Agro. Os gringos se interessaram pelo sistema de produção, pela forma como a cadeia produtiva é organizada e se admiraram com a dimensão das áreas e dos maquinários. O grupo pode presenciar a colheita da soja e o plantio de milho.

Roger Begrand, que integrou a comitiva, planta dois mil hectares no Canadá. Segundo ele, a maior dificuldade tem sido transmitir o negócio para a segunda geração. “Os jovens são cada vez mais urbanos”, comentou.

O organizado da comitiva, Larry Rupipper, que planta em Dakota do Sul, nos Estados Unidos, ficou surpreso com a colheitadeira de 52 linhas. “São raras as propriedades com grande extensão. Estou impressionado de como as pessoas tocam as fazendas aqui. É uma gestão bastante profissional”, comentou.

Tanto Larry como muitos outros produtores dos Estados Unidos acompanham diariamente o que acontece em Mato Grosso e em Sapezal. Noticias sobre o clima e o plantio ajudam os americanos a planejar suas safras.

Depois de conhecer como funciona o moderno agronegócio do interior de Mato Grosso, a comitiva encerrou sua visita com outra coisa que até pode ter “lá fora”, mas que é melhor por aqui: uma suculenta jaca.

Dados do Município

SAPEZAL

Sapezal está localizada no interior de Mato Grosso, distante 509 km da capital Cuiabá, região Centro-Oeste. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2020, sua população é estimada em 26.688 habitantes.

A cidade possui a 11ª maior economia do estado, com PIB (Produto Interno Bruto) dos Municípios de R$ 2.516.823.700 (aproximadamente R$ 2,51 bilhões).

O município é um dos principais produtores de algodão do estado. Dados de 2018 do IBGE apontam para uma área plantada de 168,2 mil hectares (ha), com 756,9 mil toneladas colhidas. A soja também se destaca, com plantio em 355 mil ha e uma produção superior a 1,23 milhão de toneladas. Além destas, outras culturas também se destacam na produção de comodities, como milho, girassol, arroz e feijão.

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