Novo porto chinês no Peru pode ser porta de Mato Grosso no Pacífico

Um novo porto que a China constrói no Peru pode ser uma porta do Brasil para o Pacífico, com um potencial de gerar ganhos significativos para as exportações nacionais.
Por ali, devem ser escoados rumo à Ásia desde materiais para a transição energética, como o lítio, a alimentos e produtos industrializados.
Ao mesmo tempo, o megaprojeto bilionário deve encurtar em um terço o tempo médio que a produção brasileira leva para chegar ao Oriente.
A empresa chinesa à frente da obra também diz que a iniciativa tem despertado o interesse de empresários brasileiros porque tem o potencial de gerar novos negócios — mas, para tirar proveito disso, o Brasil teria que investir em melhorar sua infraestrutura, dizem analistas.
Com inauguração prevista para este ano, o porto conta com um investimento da China na América Latina de natureza e porte inéditos da China.
Também é uma das principais iniciativas do ambicioso plano de investimentos de Pequim conhecido como One Belt, One Road (Um Cinturão, uma Rota, em tradução livre), ou "Nova Rota da Seda", que busca transformar a geografia econômica global, como apontam especialistas.
TEMOR DO 'TIO SAM'
Ao mesmo tempo, a construção do porto de águas profundas, que criará uma nova conexão que vem sendo apelidada de “Xangai-Chancay”, é vista com preocupação pelo governo dos Estados Unidos.
O receio é que isso amplie ainda mais a influência e fortaleça os laços comerciais (e oficiais) de Pequim com países da América do Sul e contribua para que a China controle o fornecimento de materiais críticos na região.
Localizado a cerca de 60 km de Lima, Chancay é o primeiro porto com maioria de capital chinês na América Latina.
O investimento é de cerca de US$ 3,6 bilhões (R$ 17,8 bilhões). A empresa chinesa COSCO Shipping detém uma participação de 60% no porto e a Volcan do Peru, 40%.
A pretensão é que este porto seja um novo centro de conexão da região com a Ásia que poderá trazer vantagens para uma série de países sul-americanos.
Chancay pode facilitar a exportação de materiais críticos para indústrias como a de veículos elétricos, que necessitam, por exemplo, de cobre e lítio, metais em que a América do Sul é líder em reservas.
O projeto representa também uma consolidação dos investimentos da China no Peru.
Nos últimos anos, cerca de US$ 15 bilhões (R$ 74,5 bilhões) foram destinados pela China à mineração no país sul-americano, de acordo com o governo peruano.
A presidente peruana, Dina Boluarte, se reuniu com o líder chinês, Xi Jinping, durante a reunião anual da Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico (Apec), realizada em São Francisco em meados de novembro.
Na ocasião, Boluarte reforçou um convite para que ele participe da cúpula do próximo ano, que será em Lima, e quando se espera que seja inaugurada a primeira fase do projeto.
“Os líderes discutiram a iniciativa chinesa de construir infraestrutura para o comércio internacional, algo em que Boluarte mostrou interesse em ter a participação do Peru”, disse o governo peruano em um comunicado sobre o encontro.
Nas últimas semanas, por exemplo, uma seca que afeta o Canal do Panamá impede a passagem de centenas de navios e torna os fretes mais longos e caros.
PORTA PARA OS VIZINHOS
Chancay também pode beneficiar a exportação de países vizinhos, incluindo Brasil, Equador, Colômbia, Bolívia e Chile.
Os últimos dois compõem o chamado Triângulo do Lítio junto com a Argentina, e são detentores das maiores reservas mundiais deste metal.
Como a Bolívia não tem acesso ao mar e boa parte da exploração chilena fica no norte do país, a alguma distância dos principais portos, especialistas apontam Chancay como uma potencial porta de saída para esta matéria-prima.
Ao mesmo tempo, o Peru busca consolidar-se como um hub regional em termos marítimos, explica o pesquisador.
Nos últimos anos, foram realizados investimentos estrangeiros de US$ 6 bilhões (R$ 29,8 bilhões) nos portos do país, com uma série de parceiros, segundo Narrea.
Especialistas, empresários e os envolvidos na construção concordam que o porto de Chancay é uma oportunidade do Brasil se aproximar de mercados asiáticos, especialmente para os Estados brasileiros mais afastados do Atlântico.
Com a nova rota, há expectativa de o tempo médio de entrega de alguns fretes possa cair em um terço, chegando ao seu destino em 15 dias a menos do que o normal.
“Hoje, as viagens duram em média 45 dias até a China. Essa redução significa queda nos custos e aumento de competitividade”, diz a diretora de Relações Internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, Sueme Mori.
Uma série de reuniões foram realizadas nos últimos meses com mais de cem empresários e governadores brasileiros com o objetivo de familiarizá-los com o porto e explorar Chancay como rota estratégica para a Ásia, diz Mario De Las Casas Vizquerra, gerente de assuntos públicos da COSCO Shipping.
MATO GROSSO DE OLHO
Segundo ele, o interesse vem particularmente do Acre, Rondônia e Mato Grosso. "Empresários brasileiros encontram em Chancay um atraente centro de interesse focado em busca de vantagens derivadas da redução de custos logísticos", afirma.
Vizquerra calcula que, ao longo dos anos, as exportações brasileiras pelo porto podem atingir a soma de até US$ 30 bilhões (R$ 148,9 bilhões).
Em 2022, o Brasil exportou US$ 335 bilhões (R$ 1,66 trilhão) em produtos, sendo US$ 91,3 bilhões (R$ 453,1 bilhões) para a China, que lidera o ranking de compradores, segundo o governo brasileiro.
Entre produtos que podem ser impulsionadas pelo novo porto, estão os tradicionais envios à Ásia: soja em grãos e farelo, carne bovina, celulose e milho.
Sueme Mori avalia que algumas exportações com tempo de vida útil reduzido, como frutas, também podem ganhar mercado com a menor duração das viagens.
“Sabemos que há demanda na Ásia, mas há a questão do 'tempo de prateleira' reduzido”, completa.
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